terça-feira, 1 de junho de 2021

PARADOXOS INTERDISCIPLINARES

Esse texto foi escrito há 7 anos e representa uma situação muito importante para a cultura e a arte na cidade de Guarulhos... Só quem viveu aquele momento entenderá totalmente o que ele representa... Para além de um saudosismo vazio, esse texto ainda reflete muitas questões pertinentes à nossa realidade... É, também, uma homenagem literária às pessoas que lutaram naquela época e às que ainda continuam lutando pela cultura em nossa cidade, em nosso país e no mundo...
Espero que todas e todos gostem!

PARADOXOS INTERDISCIPLINARES


    Sem a preocupação hipócrita com uma imparcialidade impossível e ilógica, você conta a nossa história com a dose certa de rigor realista e um maravilhoso excesso de leveza brincante...

    Tal como um gênio expressionista, você deforma a realidade vazia, dando a ela contornos fortes e cores marcantes, para daí extrair a essência dessa própria realidade aparentemente negada... De mãos dadas com Van Gogh...

    Tal como um exímio cordelista, que retira da simplicidade de seus versos a magia de um mundo fantástico, que acaba por se tornar o retrato mais fundamental da própria vida, você nos embala na energia saudosa de Suassuna...

    E conta a nossa história...

    A história de jovens guerreiros que são loucos pelo que fazem... E que vão à luta, brandindo suas armas feitas de orquídeas e vestindo suas roupas de retalhos que lamentam e clamam, dançando para as pessoas como loucos entre paredes... Stanislavski e Laban dançando um tango em um velório...

    A história dos falsos reis, que temem a força do populacho ensandecido em busca de seus territórios e que por isso tentam confina-los em sanatórios, alegando não entenderem o idioma que eles falam... Mas o grito deles nos alcança... Casamos com as suas bailarinas e com as suas faxineiras...

    E por mais que os tais reis fulanos tentem arrancar as nossas línguas, com facas prateadas de falsos prêmios, nós é que arrancamos deles a tranquilidade... Anarquia necessária... Bakunin discursando em cima da mesa onde se comem os pasteis dos reis com falso enchimento, que entram e saem dos seus palácios espelhados com a maior cara de pau, apenas para defenderem seu soberano máximo de suas próprias falcatruas...

    Mas esses reis estão com as pulgas atrás das orelhas, porque alguns autóctones resolveram se mostrar... E eles não sabem mais como catequizarem todos esses índios, pois eles se dividem em mais de trezentas e oito etnias diferentes... Alguns resolveram tirar as suas roupas e dançaram a dança da chuva de ouro dentro do próprio palácio espelhado...

    E você, historiador de primeira ordem, nos conta toda essa história, que é a história da nossa cidade natal, transgredindo a gramática... Transformando as reticências em pontos de exclamação, fazendo com que o belo caos das nossas vozes dissonantes deixe de ser uma oração subordinada, para que seja um último suspiro de alento aos que buscam a simples verdade...

    Que os tais reis dessas histórias fiquem distantes de nós, sentados em seus tronos corrompidos, escancarando suas bocas para que as máscaras não caiam, tendo como única diversão as piadas repetidas de seus palhaços ultrapassados ou, como segunda opção, as suas próprias piadas sem graça... O que eles querem é somente perpetuarem seus próprios nomes... Nem que para isso eles precisem se transfigurar em outros animais tidos como menos nobres, em um monólogo narcísico de si mesmos...

    Mas não se preocupe se eles quiserem protagonizar a sua história... Porque a sua geografia, mestre cartógrafo, é maior... E mesmo que eles saiam da condição de coadjuvantes e migrem para o elenco principal, ela não será alterada... Porque essa geografia foi escrita por sua pena potente e lenitiva, que buscou nos cursos dos nossos rios as curvas primordiais e nas alturas dos nossos precipícios os ângulos definitivos de um relevo repleto de vales depressivos e florestas multicoloridas...

    Ela nos convida para uma grande festa de versidões, para em praça pública entramos em comunhão e transformarmos a nossa tragédia em brilho, vertendo sangue de groselha e comendo bolo de areia... Cantiga de roda das mais sérias... Falta só o glacê desse bolo... Mas ele virá, seja por um novo caminho, seja pelo caminho velho...

    Obrigado, professor! 

Autor: Roman Lopes
Guarulhos - SP
Escrito em 2014

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