Um delírio de experiência real que eu vivi há alguns anos... Será que foi real mesmo?
EL TIEMPO PASA EN MUCHOS IDIOMAS
UMA HOMENAGEM MUDA ÀS CANÇÕES DA MINHA MEMÓRIA
O tempo voa e escoa como um líquido que flui sem parar... Isso traz à memória os relógios de Dali e uma canção adolescente que revive... E é com pouco tempo ou com todo tempo do mundo – outra memória de canção – que eu entro em contato com os cipós de tecido retorcido de Sheila Hicks... Um contato retomado, pois já nos conhecíamos, uma vez que a sua presença em São Paulo no ano de 2012, em uma tríade de tecidos torcidos que compunham muralhas, totens e relógios quebrados não passou despercebida por esse diletante apaixonado pelas artes...
O tempo me fez voar junto com ele e me levou às árvores de cipós retorcidos do Parque do Ibirapuera, morada momentânea dos cipós de Hicks... Memórias e redescobertas simultâneas pululam como pequenos símios nos galhos e eu caminho em direções diversas, como se estivesse sem rumo, mas ciente do destino que me aguarda... A plena experiência...
Passando pelo cimento que mancha de cinza o verde do parque, incluindo o próprio habitat de obras como a de Sheila, estacionei abaixo de grandes árvores seringueiras, em referência talvez inconsciente da minha infância... O que chamou a atenção foram as releituras dos cipós de Hicks feitas pela sábia natureza... A inversão da invenção...
Pensando no tempo, deixei falar bem alto Pink Floyd e o seu lado escuro da lua, apesar do sol que mostrava sua face num céu sem nuvens... E ela – a banda – falou, com suas guitarras contemporizadas e suas sonoridades de correntes quebradas pelos surtos alucinados dos cogumelos plantados à minha volta...
Os cipós das árvores cresceram para baixo, num paradoxo maravilhoso que só os loucos conseguem presenciar... E eles me abraçaram... Um abraço intenso e suave ao mesmo tempo. Eu me deixei emaranhar nos infinitos braços e dancei com eles, subindo e descendo, flutuando e pisando forte... Até que, do alto da seringueira, tendo os cipós como braços que saíam das minhas costas, eu me transformei em árvore... A pequena lágrima que passou a escorrer deixou sua transparência para dar lugar ao branco do látex divinal... E eu chorei, um choro convulsivo e redentor, pois ele não vinha só de mim. Era a própria natureza que chorava através dos meus olhos. E os cipós das árvores ganharam as cores dos tecidos retorcidos de Sheila... Uma explosão cromática próxima da eternidade...
Eu não sei quanto tempo passou e nem sei se passou algum tempo... Os relógios derretidos transformaram-se, em verdade, no relógio quebrado da tríade Hicks que habita agora a minha memória, junto com o totem, a muralha e as canções... O tempo parou de escoar e se tornou onipresente, reverberando sua majestosa ausência...
O mais importante é que eu fiquei lá, plantado entre as árvores do parque... E elas vieram comigo continuar a minha vida, numa fusão que subverte todas as estruturas e cria inúmeras possibilidades de trajetórias rizomáticas, deixando mais deslumbrante a minha experiência existencial... Como nunca e para sempre...
Autor: Roman Lopes
Guarulhos - SP
Escrito em 2017
Obs: quem quiser conhecer um pouco as obras de Sheila Hicks que estavam expostas na Bienal de 2012, bem como outras obras da mesma exposição, acesse:
http://thefakeeconomist.blogspot.com/2012/12/a-arte-nao-termina.html
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