Há exatos dez anos, eu escrevi esse breve ensaio, refletindo sobre o ensino da Língua Portuguesa, ensaio que foi publicado, à época, em uma revista científica da área... Passado esse tempo, resolvi postá-lo aqui para lançar a seguinte questão: aconteceram transformações no ensino da Língua Portuguesa nas escolas, o que tornaria esse ensaio anacrônico ou o conteúdo dele ainda é pertinente para uma reflexão?
As respostas a essa questão podem ser dadas por vocês, aqui nos comentários... Será um debate interessante...
Vamos participar?
CAMÕES OU PEÕES? EU PREFIRO TODOS OS BORDÕES!
Lindo, não?... Palavras difíceis,
expressões ricas, períodos bem estruturados e conteúdo significativo... Todos
os elementos de uma escrita bela e eficiente...
Tanto o parágrafo inicial,
propositadamente construído para ser respeitado, quanto o inoportuno
auto-elogio das linhas seguintes mostram a infelicidade do ensino da Língua
Portuguesa nas escolas.
A pesquisa no campo da Linguística
tem avançado continuamente, apontando um caminho muito rico e importante para o
uso da língua em situações de comunicação, oferecendo aos agentes responsáveis
pelo ensino da Língua uma gama muito diversificada de possibilidades e de
instrumentos. No entanto, toda essa evolução não chegou ainda, efetivamente, a
quem deveria. Por mais que o ensino da Língua Portuguesa tenha sofrido
modificações nos últimos anos, os princípios fundamentais desse ensino ainda se
baseiam na visão estruturalista, que vê a língua como um conjunto abstrato e
virtual, já pronto e que deve ser aprendido para ser dominado, bem como na
visão gerativista, que vê a língua como um sistema de processo mental e inato,
que também já está pronto e deve ser dominado. O que temos, então, é um ensino
ainda voltado para uma visão fechada da língua, como se ela fosse um sistema já
concretizado, cabendo ao aluno apenas a apreensão dos elementos que constituem
esse sistema, sinônimo de aprendizado eficiente e, consequentemente, de
sucesso. A visão interacionista da língua, desenvolvida pelas teorias mais
modernas e progressistas da Linguística, que vê a língua como um instrumento de
ação social, por isso sujeita a variações e modificações constantes, todas elas
com o mesmo valor comunicacional, ainda está distante das salas de aula. O
aluno ainda sofre sanções dos professores por não saber escrever ou ler
corretamente. O ensino da Língua ainda se baseia em frases prontas e exercícios
de repetição sistemática de regras. Obviamente podem existir exceções! No
entanto, a regra geral do ensino da Língua Portuguesa ainda é essa. E por que
isso acontece?
Segundo Fernandes (2004) “os estudos
referentes aos modos de se conceber a linguagem têm implicações que se refletem
na metodologia do ensino de língua”. Com isso, é possível dizer que o ensino da
Língua Portuguesa ainda está ancorado em regras ultrapassadas porque os
próprios professores têm uma visão ultrapassada da Língua. Muitos professores
ainda pensam que ensinar bem é fazer o aluno decorar todas as regras da norma
culta, pois só assim ele irá entender a Língua verdadeira. Os próprios
professores, muitas vezes, esforçam-se para eles mesmos aprenderem regras que
ainda não dominam. E a Língua segue sendo algo distante e vazio de um
significado mais profundo, tanto para o aluno quanto para o professor. Isso
porque o professor, muitas vezes, não tem uma postura própria em relação à
importância do uso da Língua, transformando-se num mero reprodutor das ideias
da instituição onde leciona, ideias essas que muitas vezes passam longe de um
ensino de verdadeira qualidade. É bom lembrar que o ensino da Língua
Portuguesa, na maioria das escolas, ainda está dividido entre gramática,
análise de texto e redação. Muitas vezes essas disciplinas trabalham assuntos
completamente diferentes, criando uma confusão na cabeça dos alunos, pois ele
não sabe exatamente qual a Língua a ser aprendida.
Já está mais do que na hora do
ensino da Língua Portuguesa avançar na direção das modernas teorias
linguísticas. Primeiramente, porque essas teorias representam um pensamento
extremamente inovador e profundo do que é a língua e sua importância na
construção de uma comunicação mais efetiva na vida. Além disso, essas teorias
precisam ser efetivadas em uma prática cotidiana, para que não se tornem
teorias vazias e ideias de gabinete.
Para isso, os professores devem, antes de tudo, assumir uma postura diante da
sua tarefa. Qual a sua concepção de Língua? Qual a sua concepção de mundo? As
respostas a essas questões não podem ser meramente filosóficas. Devem
representar uma atitude pedagógica na direção da efetiva transformação do
ensino, deixando de lado as verdades da norma culta e valorizando a interação
das diversas formas de linguagem, colocando o aluno no seu real papel de agente
de comunicação da vida. O professor deve se preparar bastante, com constantes
leituras, contatos com as mais diversas linguagens e, acima de tudo, um exercício
permanente de comunicação própria. Um professor de Língua Portuguesa que não
escreve não pode ser levado a sério!
O ensino da Língua Portuguesa deve
proteger as pessoas dos discursos belos e vazios, dos auto-elogios inoportunos
e da prisão de uma norma padrão, libertando todos em um sistema interativo e
auto-construtor, onde todos são agentes e receptores permanentes de situações
comunicativas. Pois como diria o próprio Bilac, a Língua Portuguesa é ... esplendor e sepultura...
Autor: Roman Lopes
Guarulhos - SP
Escrito em setembro de 2010.
Refletindo aqui com meus poucos botões... (rsrs)
ResponderExcluirCom o "avanço" das redes sociais, temos presenciado (mas não de forma passiva, pois também fazemos parte disso) mudanças imensas na forma de escrever, de dialogar (virtualmente)... Mudanças essas que - creio -não podemos dizer, ainda, que trarão benefícios à nossa já sofrida língua portuguesa. Contudo, penso ser extremamente necessário e urgente pensar em como adequar a metodologia do ensino da língua portuguesa (nota: prefiria dizer língua brasileira, mas esse termo não existe oficialmente, não é mesmo?) a esses "novos tempos", tornando-a, assim, um instrumento de ação social.
Belas colocações, Janethe!
ExcluirÉ importante refletirmos sobre todas as dinâmicas existentes, sem nenhum preconceito...